Entrevista
com o fundador da RINEPE – Rede Internacional de Estudos e Pesquisas em
Liderança e Empreendedorismo.
E- Professor Caubi Tupinambá, quando o senhor concluiu a
graduação em Psicologia? E qual foi a sua primeira atividade de trabalho nessa
área?
CT- Conclui minha graduação em Psicologia em final de 1980 na
UFC, fazendo parte da terceira turma do Curso de Psicologia. Já em 1981 fui
contratado por uma indústria têxtil de Fortaleza, na qual tive a oportunidade
de criar o departamento de Recursos Humanos daquela empresa, que estava
iniciando suas atividades industriais. Além do trabalho na indústria têxtil,
tive, paralelamente, a oportunidade de participar de alguns trabalhos de
consultoria organizacional na cidade.
E- Em que momento ingressou na carreira
de professor e quais foram as suas principais atividades acadêmicas?
CT- Depois de sair da indústria têxtil recebi uma bolsa de
estudos do governo austríaco para fazer meu mestrado na Universidade de
Salzburg, naquele país. O mestrado em Psicologia foi de 1982 a 1984, quando a
seguir me mudei para Nova York e tive alguns cursos (cadeiras) em Psicologia na
New School for Social Research daquela cidade. No entanto regressei à Áustria
em 1985 para eventualmente continuar o doutorado, o que não aconteceu pois
preferi retornar ao Brasil naquele mesmo ano. Assim, já no início de 1986
comecei minha carreira de docente no ensino superior em duas instituições de
Fortaleza, nomeadamente, Universidade de Fortaleza (UNIFOR) e Instituto de
Ciências Religiosas (ICRE). Já no ano de 1986, em setembro, entrei, por meio de
concurso, para o curso de Psicologia da Universidade Federal do Ceará, na
cadeira da ex-professora Yang Yeh Fon Ferreira, que havia sido remanejada, a
seu pedido, para o setor de Recursos Humanos da UFC. Com ela e já lotado como
professor ainda tive a oportunidade de trabalhar na área de treinamento e
desenvolvimento de R.H. para servidores da UFC em várias ações do seu setor.
E- Quando criou o programa RINEPE e o que despertou no senhor
a ideia de criá-lo? Como surgiu o nome do programa e a sigla RINEPE?
CT- O Rinepe foi criado por mim após
meu retorno do pós-doutorado na Universidade Complutense de Madrid (Espanha)
entre 2004/2005. As pesquisas desenvolvidas no Doutorado na Universidade de
Giessen (Alemanha) com o Prof. Michael Frese e continuadas no Pós-Doutorado na
Espanha, acrescidas das contribuições do Projeto Globe com o professor
Francisco Gil Rodriguez foram o mote para a criação do Projeto que em pouco
tempo, dada a sua expansão, se tornou um Programa de Extensão, não só com
atividades voltadas para o estudo e pesquisas com pequenas e médias empresas,
mas também como outros tópicos da psicologia organizacional e do trabalho por
mim abordados nos cursos de Graduação, Pós-Graduação lato e stricto sensu, a
exemplo do tema do comprometimento organizacional e culturas. O nome Rede de
Estudos e Pesquisas sobre Liderança e Empreendedorismo se originou na
necessidade de se ter um nome que expressasse nosso trabalho em “rede”
(network), com outros profissionais e outras instituições. Foi ainda mais
reforçado quando tive a oportunidade de visitar o “Institute of Small
Enterprise and Development (ISED-India) e nos colocamos nessa “rede" de
estudo e ação relativos às PMEs ao redor do mundo. Nome e sigla foram produto,
portanto, de uma espécie de brainstorming provocado por nós que então
formávamos o projeto no seu primeiro ano e alguns dos primeiros bolsistas, por
exemplo, Thiago Pinto Pereira e Isabella Barbosa, ambos do curso de
Administração da UFC.
E- Depois de criado, qual foi a primeira
atividade desenvolvida pelo RINEPE? E que outras atividades do programa
gostaria de destacar?
CT- As primeiras atividades eram de pesquisas sobre pequenas
e médias empresas em geral e no Ceará,
bem como em Fortaleza, a partir dos trabalhos desenvolvidos na Alemanha, nos
quais eram comparados empresários locais no que tange a suas estratégias
organizacionais, principalmente estratégias de natureza psicológica para tocar
seus negócios, fazê-los crescer e prosperar. Havia atividades de orientação de
alunos, fossem eles bolsistas ou voluntários, bem como elaboração de trabalhos
para publicação e apresentação em congressos e outros eventos. A partir daí
surgiram ideias que levaram estudantes a pleitear bolsas internacionais, com
êxito, outros desenvolverem trabalhos de monografia de conclusão de curso de
graduação e pesquisas de pós-graduação. Ademais, tivemos a possibilidade de
reforçar elos da Rinepe com outras instituições locais para atividades de
pesquisa e consultorias.
E- Caracterizando o escopo internacional da RINEPE o senhor
trouxe professores de universidades internacionais para ministrar cursos e
palestras aqui, como os professores Omar Aktouf, Michael Frese e Gil Rodriguez.
Como articulou essas parcerias?
CT- Além desses professores, vale a pena lembrar que houve
também a participação de outros nomes de peso na Psicologia e Administração no
âmbito nacional, como a Profa. Ana Paula Moreno Pinho, da Universidade Federal
da Bahia (UFBA), Prof. Sidney Nilton de Oliveira, da Universidade Federal do
Paraná (UFPR) e Professora Janisse Aparecida Janissek, também da Universidade
Federal da Bahia (UFBA). Contamos também com a parceria da Profa Meirijane
Anastácio, da Profa Suzete Pitombeira (FEAAC-UFC) e do psicólogo Adauto
Montenegro (IFCE).
O Professor Omar Aktouf, parceiro da
Universidade de Quebéc no Canadá, esteve em Fortaleza e contribui com seu
conhecimento na área da Psicologia e Administração com várias atividades junto
à Rinepe que se estenderam a outras instituições além da UFC. Tal se deu pelo
empenho da então Psicóloga e mestre em Psicologia Raquel Libório, que também
faz parte da Rinepe desde que passou a integrar os quadros funcionais do
Departamento de Psicologia e já conhecia o professor Aktouf da época do seu
doutoramento na mesma universidade em que o professor é lotado no Canadá.
O Professor Michael Frese, que hoje
ensina em duas universidades, Universidade de Lüneburg na Alemanha e National
University of Singapore em Cingapura, teve um papel central na criação da
Rinepe. Quando conheci o Professor Frese ele era professor titular da
Universidade de Giessen, também na Alemanha, na área de Psicologia do Trabalho
e das Organizações, o que me fez me transferir da Universidade de Colônia para
a de Giessen em busca de sua orientação na minha tese doutoral, que sob sua
orientação defendi em julho de 1999. A partir daí desenvolvemos uma parceria
acadêmica que dura até hoje. Isso resultou na sua vinda a Fortaleza, após meu
doutorado, para reforçar nossos laços acadêmicos, quando, por meio de
financiamento do Deutscher Akademischer Austauschdienst (DAAD) do Ministério da
Educação da Alemanha, veio a Fortaleza e realizou diversas atividades junto à
nossa instituição. Foi para trabalhar novamente com o Prof. Frese que voltei à
Alemanha, dessa feita para realização de um estágio sênior junto à Universidade
de Lüneburg entre 2010 e 2011. Nessa altura pude receber o então reitor da UFC,
professor Jesualdo Pereira, na Universidade de Lüneburg, onde fechamos um
convênio interinstitucional que previa, entre outras coisas, intercâmbio de
alunos entre as duas instituições. Vale a pena salientar que as atividades
desenvolvidas durante este estágio também estavam diretamente relacionadas com
o conteúdo proposto pela Rinepe.
Com o Professor Francisco Gil
Rodriguez tive a oportunidade de desenvolver meu estágio pós-doutoral entre
2004-2005 na Universidade Complutense de Madrid, onde é professor titular.
Nesse estágio desenvolvemos diversas atividades relativas a pesquisas que
estavam no âmbito da Rinepe e da nossa pós-graduação na UFC em Fortaleza. Isso nos
rendeu posteriormente um convênio com a CAPES e com órgãos do Ministério da
Educação da Espanha que permitiram a continuação do nosso grupo de pesquisa,
viabilizando viagens de estudo minhas e do professor Gil, respectivamente para
a Espanha e para o Brasil onde realizamos e participamos de variadas atividades
no âmbito das nossas universidades e outras instituições locais. Esse convênio
teve a duração de três anos.
E- Foi muito importante o senhor ressaltar as parcerias no
âmbito nacional. E a equipe local? Poderia falar um pouco dos profissionais da
UFC e dos bolsistas que participam ou participaram da equipe?
CT- A equipe local da Rinepe sempre foi constituída de
bolsistas oficiais e voluntários advindos de diferentes cursos de graduação,
profissionais externos à UFC, professores de outras instituições, estudantes de
pós-graduação e, desde 2010 em regime de parceria, isto é, em co-coordenação
com a servidora e hoje doutora em Psicologia Raquel Liborio Feitosa, a quem a
Rinepe deve muito do seu avanço e consolidação. Após minha aposentadoria a
Rinepe continua ativa e sendo coordenada pela Raquel. Os bolsistas sempre foram
um grande trunfo das nossas atividades e da própria Rinepe. Sabemos que eles
não passam apenas por aqui, mas levam consigo muito do que aqui fazem e
aprendem, pois constatamos seu reconhecimento do que puderam realizar
profissionalmente após suas experiências de bolsistas na Rinepe. Temos muitos
relatos de colocação profissional, continuação de estudos posteriores em outros
projetos acadêmicos como a pós-graduação e até mesmo oportunidades de se
engajar em universidades estrangeiras. Isso nos enche de orgulho e satisfação
em saber que as pessoas não passam apenas pela Rinepe, mas que continuam
carregando para a sua vida pessoal e profissional o bom que colheram por aqui.
Nós também a eles devemos muito do que conseguimos em termos de desenvolvimento
dos estudos e pesquisas que iniciamos e desenvolvemos na Rinepe.
E- De fato, esse caráter de campo de estágio e formação
multidisciplinar que a RINEPE tem é sempre ressaltado como enriquecedor pelos
acadêmicos que passam pelo programa, bem como pelos profissionais que o
coordenam. Sabemos que antes da sua aposentadoria, o encerramento da sua
carreira na UFC foi coroado com a publicação de um livro que se vincula às
ações da RINEPE. O senhor podia nos falar um pouco mais sobre o livro?
CT- O livro se intitula “Liderança e Empreendedorismo em
Perspectiva Intercultural”, editado pelas Edições UFC em 2020 e compila dados e
pesquisas que refletem muito do que fizemos ao longo desse tempo na Rinepe. Ele
foi organizado pelo professor Francisco Gil Rodriguez e por mim, e traz
colaborações de pesquisadores e professores que foram importantes para a nossa
trajetória acadêmica, bem como a nossa experiência como Programa de Extensão.
E- No momento atual, vivemos uma pandemia que afeta
diretamente os trabalhadores, as condições de trabalho, as PMEs e a economia.
Como enxerga o quadro atual levando em conta a perspectiva dessas várias
categorias e setores?
CT- É talvez o que de mais sério e desafiador nos há ocorrido
nesse século e, dificilmente será superado por qualquer evento de maior
tamanho. Esse desafio vai necessitar, como nunca, da ciência e de seus atores,
para encontrar meios de lidar com essa pandemia, para que as pessoas, ao seu
final, estejam aptas a vê-la como um evento histórico na dimensão que tomou e
repensar tudo, a vida, a terra, e as formas de não repetir erros e tocar o
barco adiante. Todos estamos sofrendo
com a pandemia e seus efeitos, alguns mais, principalmente aqueles que são
desassistidos e que, injustamente, não contam com o suporte necessário e
merecido de governos ausentes e irresponsáveis como o nosso governo federal.
Temos a sorte de estar contanto com líderes locais que se despregam das investidas
desumanas do plano federal, o que pode ser um diferencial positivo futuro para
as empresas e os trabalhadores. Certamente o mundo dos negócios vai ter que se
reinventar não somente durante a crise, achando alternativas de atuação na sociedade
e buscando a merecida ajuda do Estado, mas também posteriormente, sabendo que o
modelo de economia que prega a ausência máxima do Estado e a selvageria no
mercado não terá mais vez daqui para frente.
E- De que forma acredita que seremos afetados pós-pandemia?
Quais os cenários do trabalho, das PMEs?
CT- É esperado um novo cenário para esse conjunto de empresas e
de trabalhadores. As já enfraquecidas relações de trabalho que expuseram as
fragilidades das pessoas para reagirem ao inusitado dessa pandemia só nos
mostram que nada será como antes. Novas missões e visões dessas empresas serão
necessárias para que possam lidar com o futuro e suas incertezas.
Responsabilidade social não poderá ser apenas mais um item que as empresas
incluem na sua descrição para aparecem bem “na fita”. Deverá sim ser um motor
constante para que elas não apenas suguem a energia de um planeta e de um povo
esgotado em benefício próprio, mas que signifique de fato a assunção de um
propósito mais humanista e coletivo, visando também o bem e não apenas o lucro,
a qualquer custo, inclusive a custo da morte e da destruição. Vamos torcer para
que o sinônimo de empresário, qualquer que seja sua dimensão, pequeno, médio ou
grande, não signifique ser apenas um acumulador de riquezas em detrimento da
vida, mas sim e, além disso, um propulsor de soluções para o bem-estar de si e
dos demais. Assim, todos podem sair ganhando apesar dos danos causados por essa
catástrofe "anunciada".
Fortaleza, 08 de maio de 2020.
#FIQUEEMCASA
Obrigada professor por nos conceder
esta entrevista, e parabéns pela excelente iniciativa de ter criado a RINEPE!
A presente entrevista representa nossa
homenagem, reconhecimento e agradecimento ao trabalho do Prof. Dr. Antonio
Caubi Ribeiro Tupinambá.
Entrevistadoras:
Raquel Feitosa (coordenadora RINEPE) e
Nataly Alves (bolsista RINEPE).
Obrigado pela entrevista. Que a Rinepe siga firme sob sua batuta!
ResponderExcluirparabens prof. Caubi, a gente fica honrada pela sua entrevista e homenagem agradecida pelo seu trabalho junto ao Rinepe. Você também Raquel, meus parabens.
ResponderExcluirParabéns ao Rinepe pela entrevista.
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